sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Junto à Bandeira




As óbvias e bonitas palavras de amparo
podem até fazer você recordar dos reais bons momentos
da abrangente domesticação.
Uma palavra útil pode fazer você pensar mais alto,
mas isso serve apenas para mostrar
quão raso junto ao chão você se encontra.
Não posso lhe pedir para sorrir:
agora será mais construtivo encarar sua mente
do seu úmido ponto de vista.
Não posso lhe pedir para não chorar.
Não poder mandar embora
toda essa montanha de hipocrisia à sua volta
é um sentimento demais pesado para você carregar
– e parece que sou o único a enxergar isso.
Ah! deixe-me carregar tudo por você, para você;
ah! deixe-me agora mesmo
carregar tudo para longe!
ou fugir com você, voando,
ao som dos bufonescos acordes...

       Agora só eu posso saber que você chora,
       parado, estático, junto à Bandeira.
       Só eu posso saber
       que a lágrima que cai, assim tão discreta,
       está longe demais de mim.

Ao invés de um berro que exulte
as elegias que revolvem seu intimo,
apenas um murmúrio de lábios trêmulos,
numa automática sincronia cadenciada...
Eternidade em minutos.
Por meses e anos, as flores e o mel
de um jardim particular.
Há dias, de repentino varreu-se até os primeiros esboços
de um inocente anseio por redenção.
Cobrindo tudo, o lacre de uma ambígua credulidade.
Tão simples eram os desejos e as esperanças;
porém, assim abstraídos, distantes,
acabaram por assumir aspecto de vã quimera
ou momentos de devaneio pedante,
todas aquelas visões e intuições
que se pudessem voltar exatamente agora,
neste pináculo de vulnerabilidade,
apenas fariam com que se arrebatasse
o único sopro de vida de um ser vivente,
na forma de um arrependimento autoquestionador
que brilha e timidamente escorre...

       Agora só eu posso saber que você chora,
       parado, estático, junto à Bandeira.
       Só eu posso saber
       que a lágrima que cai, assim tão discreta,
       está longe demais de mim

e faz-se de simples, de pouco, de nada
– invisibilidade, para os vultos ao redor.
Como é doce e tentador,
em voos de imaginação, fazer-se de algo,
ou fazer-se não-feito;
talvez a si próprio fazer desfeito,
desligar-se do momento
e da momentaneamente traidora compreensão...
Amargo é retornar em meio ao fel que persiste
e tristemente constatar que ele é um tudo,
cercando-o nos olhares opacos de entidades
autoconvenientes, ufanistas, histriônicas,
assim falantes, pensantes;
porém tão medíocres no falar,
medíocres no pensar e

       agora só eu posso saber que você chora,
       parado, estático, junto à Bandeira.
       Só eu posso saber
       que a lágrima que cai, assim tão discreta,
       está longe demais de mim.

Ah, quem me dera poder abraçá-lo,
quem me dera poder envolvê-lo
e dizer-lhe que há uma luz!
Dizer-lhe-ia: eis aqui sua defesa,
seu advogado, sua testemunha, seu amanhã!
Feche os olhos, transforme-se em você!
Passagem lhe trarei, passaporte, o quê mais;
só viva o que vive, nunca o que morre
em sua surrada intimidade, algo tão pesado sobre os pés,
e no entanto tornando-se digna de constar
num arquivo translúcido, aquoso, minúsculo,
que lhe desce pela face
e lhe some no pescoço.
Delicado, etéreo, quase imperceptível.
Se eu pudesse...
Meu Deus, se eu pudesse!...

       Agora só eu posso saber que você chora,
       parado, estático, junto à Bandeira.
       Só eu posso saber
       que a lágrima que cai, assim tão discreta,
       está longe demais de mim.








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