terça-feira, 3 de abril de 2018

Poema comestível V






O brilho liso da fruta indefinida
sugere cores e portais gustativos
mais variados de acidez-transporte
que a embriaguez do suco vivo
escorrido do cobiçado lábio
já ulcerado de prazer.

O código cítrico suavizante
de culpas ancestrais
é o caminho inusitado e excitante
aos sentidos desafiantes
que encontramos suspenso na ramagem
desvelada pela busca idílica
nas névoas eternas
do verde viver.

E quando desabrocha o espetáculo das cores doces,
a florescência fluoresce o rodopio da estrela raiada
para verter o líquido sal suave
dos cantos dos globos profundos.

..................................

Volto-me ao córrego cujas águas recuam
à mera visão dos pés
daquele que nada provou do que mais desejou.
Mas o gosto pela água
e pelos fluxos sinuosos
irrigadores dos carnais universos
é um chamado
que me faz pensar em voltar de voltar...

Voltas à paisagem
agora devastada pelo fogo
já apagado mas lembrado
pelos restolhos arbóreos doloridos.
Procuras-te com tua lamparina
em plena luz diurna.
Agachas...
Nem uma única raiz
do conto-de-fadas teológico.
Uma piada lógica de mau gosto
assoviada pelos corvos brancos.
Negros cisnes que flutuam na distância
te sugando todo raciocínio...
Rende-te!

O brilho indecoroso do desejo intravenoso
– saboroso, suculento até a exaustão –
explode entre os signos austrais;
os astros caindo aos pedaços
sobre nossas humílimas concepções
de realidade.
É somente no interior de nossos sonhos
que conhecemos a matriz
da felicidade sempre prometida
e sempre negada.

– Nega-te!

– Jamais! Tenho asas
por debaixo das feridas...
Tenho um gosto por vida,
singular como uma mordida
de um suga-almas sedutor,
insidiosa como um gole
de veneno restaurador.

Um amor, espatifado
pelas trilhas áridas
cuja visão não ousamos degustar.

Em algum lugar,
em algum lugar eu sondo
os sentidos presumíveis da visão.
Planetas gloriosos,
esferoides suspensos no espaço
como frutas redondas nas extremidades infinitas (?)
de uma imensa árvore
fractal.

(De súbito, um esguicho vermelho
contra a lente da objetiva.)

“!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!”

Cala-te, some daqui,
peçonha fantasma!!
Tortura extrema de nossas esperanças
de preenchimentos afetivos!!
Anatemizada seja sua pacifi

(– Nossa, que exaltado está
este nosso representante...
Incapaz até mesmo de distinguir
os caldos e os sumos,
os bagos e as polpas,
todas as sutis distinções solicitadas
pelos inocentes combatedores
da Máquina da Guerra...)

– Calem-se!
(– Calem-se!)
[(– Calem-se!)]
{[(– Calem-se!)]}

Chega. É do cálice que provamos
o processo gerador
em sua versão mimética da corrupção.
Embora seja tão bom o sabor,
tão irresistível a tentação
de todas as instituídas e unanimemente aprovadas
inocências...

Permito agora aos mundos todos
que girem em paz.








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