quinta-feira, 4 de julho de 2013

Educação e desinformação (Parte 2 – O papel da escola)


Revendo o papel da escola. Os arcaísmos ainda presentes na educação pública.




O ensino público, de modo geral, não exerce com diligência suas principais funções. E nem pode se utilizar da justificativa falaciosa de que insuficientes recursos financeiros inviabilizariam novos projetos se ensino, como veremos.

Percebemos, de início, um imenso contraponto entre a realidade do ensino e o que este deveria ser. Ora, quais as verdadeiras funções da escola? E qual é o quadro atual?

A ênfase costuma ser na abordagem de questões de conhecimentos gerais, sem objetividade, não-urgentes por excelência. Perde-se tempo num emaranhado de considerações de ordem ontológica, avançando nas ciências específicas de modo a causar no estudante uma sensação de alienação para as questões de ordem social (o mais urgente), sentimentos de inferioridade e submissão surgidos diante do gigantismo das matérias expostas. É gasto um tempo considerável com temas abordados fora do contexto, apesar de sua importância (em outros contextos); sendo isso válido sobretudo para as ciências exatas – todas que bem poderiam ser mostrados apenas em seus conceitos básicos, assimiláveis pelo indivíduo em seu cotidiano. Não se tem em vista uma objetividade prática que possa ser prontamente utilizada pelo aluno, na qual este possa se inserir imediatamente. Por exemplo, com relação à Matemática, deveria haver uma ênfase no aspecto financeiro (taxas, juros, investimentos, em suma: uma contextualização humana, prática e social, sintonizada com o presente e preparatória para o futuro) e jamais, a nível de ensino de 1o e 2o graus, tamanha celeuma em torno de problemas de geometria aplicada, em suas minúcias, que deveria ser ensinada apenas àqueles indivíduos que já optassem pela carreira matemática, numa universidade.

Citemos o exemplo do autor deste trabalho: somente foi “gostar” de matemática ao realizar um curso de Auxiliar de Escritório, no qual descobriu a grande importância prática da Matemática Financeira. Vejam bem: tratava-se de um curso opcional, e a referida matéria, nessa contextualização, nem sequer consta no currículo de 1o ou 2o graus. Ou seja, quase ninguém, no Brasil (e no mundo, presume-se) fica sabendo que uma disciplina geralmente encarada como “chatíssima” pode ser “legal”.

Sim, a escola se pretende formadora de profissionais e de caracteres civicamente humanos. Mas, como se não bastasse renegar estas funções a postos secundários diante das questões científicas e de conhecimentos gerais (evidentemente importantes e imprescindíveis, mas não como prioridades), ainda as transmite de forma desorganizada (ao menos como chegam até um aluno da rede pública, mesmo que, em tese, sejam elaboradas com alguma metodologia) e desobjetivada, até mesmo ocasionando a destruição, por assim dizer, dos próprios alegados objetivos.

Ocorre, de fato, uma produção de marginalização e exclusão social por parte do atual ensino institucionalizado. Como esta se dá?

Ora, não há um devido acompanhamento do estudante, desde a sua infância, no que diz respeito a um direcionamento às futuras atividades profissionais. Em suma, não há orientação vocacional de forma alguma – e esta ausência é a principal causa da marginalização.

Quando costuma haver o ensino profissionalizante? Na etapa final da adolescência, sem que o indivíduo tenha sequer noção do que seja “vocação”. Ocorre que não basta se “querer” exercer esta ou aquela profissão, visando unicamente o maior lucro, ou o status social, ou ainda acatando decisões familiares ou provenientes de um senso comum (influência de amigos, geralmente), se esta profissão assim tão irrefletidamente escolhida não estiver de acordo com as predisposições naturais do caráter íntimo da pessoa.

Faz-se necessário, para isto, uma forma de ensino que seja mais de observação e análise de comportamentos, ao invés de imposições.

Por que não empreendê-lo desde a infância do estudante?

O ensino profissionalizante não deve ser prescindido na infância sob a alegação de que crianças ainda não podem decidir sobre seu destino profissional. Alegação sensata, de fato, mas não se pretende aqui conduzir arbitrariamente o indivíduo a seguir por caminhos contrários à suas disposições, mas, justamente, iniciar um programa de análise criteriosa do comportamento da criança, em todas as suas atividades, para que se descubra, por meio da Psicologia, quais os possíveis caminhos vocacionais que a personalidade natural desta criança indicará.

Assim, se o professor observar que o aluno X demonstra desempenho notável para as artes plásticas, logo entrará em contato com os pais ou os responsáveis por ele, e lhes informará da necessidade de matricular a criança ou o jovem em cursos especializados, para que possa desenvolver plenamente suas naturais habilidades, tornando-se, por fim, ao mesmo tempo um profissional de êxito e uma pessoa humana plenamente realizada. O professor e a escola poderiam, ainda, indicar as instituições adequadas para a inserção do aluno daquele ponto em diante, caso o adulto responsável solicite maiores esclarecimentos.

Em suma: cada ser humano tem uma ou mais vocações bem pessoais e especiais, que devem ser descobertas o mais cedo possível para que haja um planejamento de futuro profissional e de inserção social. Nenhum ser humano, não importando quem seja, é em essência inútil ou vagabundo: o que há é tão-somente pessoas que ainda não descobriram seus reais talentos e capacidades, para poder aperfeiçoá-los ainda mais, com estudos persistentes.

Não haveria assim mais desempregados e desocupados, ou ainda indivíduos insatisfeitos com seu emprego. Todos trabalhariam bem, se fizessem o seu melhor; mas para isso cabe que se diga: não se trata do melhor em qualquer setor, mas apenas daquele que corresponder às reais capacitações do ser.

A grande urgência, o critério norteador de tudo, como já dissemos, é garantir a perfeita inserção do aluno na sociedade. No caso, a sua sociedade, aquela que lhe é própria e peculiar por disposição natural.

Voltando neste ponto à questão da educação escolar, percebemos que esta não opera nem ao menos no sentido de promover uma saída para a diferença de personalidades entre os alunos. Como as pessoas não são iguais em aspirações e aptidões, é insensato que se condicione todos ao mesmo tratamento, uma vez que a própria Justiça já tem seus compreensíveis relativismos. É por tudo isso que se insiste na importância de um acompanhamento, até para a descoberta dos ambientes de estudo que mais se ajustem à personalidade do aluno e a seus talentos potenciais.

Bem, a esta altura já vimos claramente que há um grande problema de foco de prioridade no ensino público, associado a um notório desinteresse pelo futuro do estudante. Já vimos que tal sistema educacional funciona como uma verdadeira “máquina” de exclusão social, uma vez que gera desemprego, subemprego, má-inserção na sociedade, marginalização em geral e uma enorme falta de perspectivas para com o futuro.

Agora, para complementar a tese, colocaremos algumas sugestões de disciplinas viáveis a serem implantadas no currículo básico do ensino, todas importantíssimas segundo o critério de prioridade:

PLANEJAMENTO FAMILIAR;
PROGRAMAS DE SAÚDE (incluindo primeiros socorros);
ORIENTAÇÃO VOCACIONAL;
FILOSOFIA (destaque para o aspecto crítico e o estudo dos valores);
ÉTICA (mais objetiva que o ensino religioso);
LEGISLAÇÃO etc.

Algumas já estão, de fato, presentes no cotidiano de certas instituições, mas não com o caráter de obrigatoriedade (no melhor dos sentidos), e nem sequer recebem a ênfase merecida, sendo geralmente consideradas inferiores, em importância, à matérias como Matemática, Física, Química etc., quando, em realidade, são muito mais necessárias segundo o já exposto critério.

Evidentemente, os assuntos seriam abordados com diferentes níveis de aprofundamento em cada graduação do ensino.

Ocorre, entretanto, que certas disciplinas já “clássicas”, não obstante sua consagração e tradicional presença, nem sempre visam a plena realização do ser humano, visto que excluem certos pontos fundamentais que lhe dizem respeito.

Vejamos, por exemplo, a História. Novamente citando uma experiência deste autor, mencionemos o fato de este apenas ter descoberto as reais implicâncias de conceitos como “liberalismo” e “globalização” a partir do momento que se incluíra no estudo superior; em uma universidade. Ora, nunca desmerecendo as universidades mas antes criticando o ensino público de 1o e 2o graus no Brasil, pergunta-se o porquê deste ensino dificilmente completar, em um ano letivo, a parte mais importante do estudo da História Universal – a parte que antecede imediatamente o atual quadro social. Note agora que, no caso, “liberalismo” nem pode ser considerado algo novo (apesar do nome “moderno” com que batizaram sua versão maligna), mas, de qualquer forma, o ensino público brasileiro tem como capricho dar por encerrada “sua” História lá pelos meados do século 19, e, mesmo quando aborda questões mais recentes, geralmente o é com referência aos fatos consequentes, restritamente, friamente, sem revelar o fator IDEOLÓGICO que permeia as etapas da História.

Pode-se chegar a mostrar um quadro geral do que foram as duas grandes guerras e acontecimentos do período, mas palavras como “socialismo”, “capitalismo”, “niilismo”, “revisionismo”, e, sobretudo (o que é mais vexatório), “revivalismo”, são, quando não mencionadas, sub-relevadas.

Indo mais longe: não haveria agora uma orientação ideológica por trás dessa má-realização do ensino? É irresistível concluirmos por isso, diante do que foi exposto.

O que nos induz a assim pensar é a própria clara viabilidade material da implantação deste programa de reestruturação do ensino. Não se trata de investir em tecnologia; este é assunto paralelo. Não se trata de contratar novos professores – embora a necessidade constante disso já seja banal em nosso país. Basta que todos sigam a nova cartilha, dentro de sua especialidade. Em suma: não é possível que se leve a sério o argumento de que faltam “verbas” para isso, quando a máquina pública gasta demais em programas educacionais mal direcionados e de esclarecimento público que mais desinformam do que informam...

O que está acontecendo é uma “contrapedagogia” que pode estar servindo de veículo para uma forma de opressão organizada. Ora, o povo em sua totalidade nem ao menos tem ligeiras noções do que seja a natureza e a origem das principais facções políticas, religiosas e filosóficas! Se o soubesse, provavelmente não votaria em nenhum partido que hoje ostentasse um L ou um N em sua sigla, ou até duvidaria que alguma vez o próprio Deus tenha dito “Não deixarás viver a feiticeira” nas páginas de um livro escrito por seu dedo...

Por que só aprendemos certas coisas tão relevantes apenas quando cursamos uma faculdade? Quanto fanatismo e quanto sofrimento não são resultado de simples falta de informação – em um mundo que se gaba de ter chegado à tamanha evolução tecnológica, no que diz respeito às comunicações?!

É paradoxal, é infame, mas reconheçamos que vivemos uma crise de informação na Era da Informação. Resta-nos saber se esta crise foi provocada, com algum propósito pernicioso, ou se é oriunda de mera ignorância.

Ignorância, por parte dos detentores de maior informação? É altamente improvável. Sabemos, pela própria História, que a partir do momento em que a humanidade não mais se deixa governar pelos detentores da força bruta, este governo – seria melhor dizer “controle” – passa para os mais bem informados.

Forçoso é concluirmos pela existência de um fator autoconsciente de fomentação de desinformação.








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