quinta-feira, 4 de julho de 2013

Educação e desinformação (Parte 3 – O papel dos meios de comunicação)


A Mídia Pedagógica. Como os meios de comunicação nos formam e como poderemos nos aproveitar disso para melhorar a sociedade. Redimindo a máquina da desinformação.




Abordaremos agora a problemática acerca do papel que os meios de comunicação exercem na formação do indivíduo.

Formação” de um indivíduo sugere de imediato “educação”. Já vimos que esta não pode, em última instância, ser privilégio exclusivo do sistema escolar – e, mesmo assim, em qualquer biblioteca que se preze, onde há um corredor ou uma estante dedicados ao tema Educação, quase todos os volumes encontráveis versam sobre a educação no contexto escolar.

Uma análise antropológica do assunto revelaria uma série enorme de fatores que levam à formação do ser humano, no campo da educação. Mas, em qualquer sentido que olhemos, não conseguiremos fugir do tema comunicação.

Conhecemos muito bem qual o caráter da maior revolução tecnológica dos últimos tempos – o conjunto de tecnologias que promove os meios ágeis e amplos de processamento de informação. A informação consiste, dessa forma, numa autêntica moeda corrente para os tempos atuais, e, mais que isso, como já vimos, pode ela servir de mecanismo de controle social, pois é histórico que os detentores de maior informação (veja bem: não conhecimento, embora as implicâncias sejam um tanto semelhantes) tenham controle sobre os indivíduos menos informados.

E que atitude pretende-se aqui defender? É a seguinte: que os meios de comunicação de massa (televisão, publicações, o próprio ciberespaço etc.) possam ser efetivados como instrumento educacional positivo e construtivo, pois que, de qualquer forma, estão eles a nos “educar”, no sentido de “condicionar” e “formar”, quer nos apercebamos disso ou não.

Como o conceito popular de “educação” já sugere, de imediato, algo modorrento e tedioso, é compreensível que o povo em sua totalidade repudie ser “educado” quando podia muito bem se valer dos meios de comunicação de massa como veículo de entretenimento para suas vidas tão sofridas...

Logo se percebe, assim, que a institucionalização da educação tem enveredado por caminhos errados, ao ignorar os meios de assimilação condizentes com as aspirações humanas mais essenciais. As crianças percebem isso, e muito bem, mas não sabem como dizê-lo. Ir à escola, para elas, é geralmente um fardo, uma obrigação, mas não uma iniciativa. Isso porque não se costuma utilizar, no ambiente escolar, as deixas do natural instinto de curiosidade do ser humano – algo dentre o que temos de mais sagrado! – com fins pedagógicos.

Portanto, deve-se fazer uso da atratibilidade em matéria de educação.

Mesmo que se consiga implantar um programa de reestruturação do ensino público e, quiçá, distribuir para o povo uma cartilha de planejamento familiar, estas medidas podem bem ser antecedidas, por fatores práticos, pelo já referido uso diligente da comunicação de massa – mas do tipo ao qual todos tenham acesso.

Não nos referimos, por sinal, à Internet. Nos países menos desenvolvidos, onde a desinformação alcança sua culminância, o computador ainda constitui um luxo para a maior parte das pessoas, e, de qualquer forma, por debaixo do seu caráter “optativo” que deixa-nos inteiramente livres para escolher nossa “programação”, pode se ocultar uma ainda maior manipulação – o indivíduo se fia inteiramente naquilo que crê seja uma benéfica liberdade e autonomia, mas... a busca pela informação via Internet se dá com que critérios de escolha? Pessoas de pouca formação ou até pouco caráter não conseguem fazer bom uso das comunicações informatizadas, pois só escolhem o que já atende à sua ignorância. O critério da busca pela informação já é preconcebido, preconceituoso, irrefletidamente, porque condicionado. Assim, não se quebra a barreira da desinformação massificada.

Qual seria, então, o meio perfeito para instrução pública, acessível, barato, atraente e popular, que poderia agora entrar em todas as casas – sobretudo nas mais inóspitas e miseráveis?

Eis aqui um cenário.

Uma noite qualquer, em um dos mais simplórios casebres do mais precário conjunto habitacional brasileiro (a favela), onde faltam muitos itens de comodidade ocidental, é difícil não depararmos com um grupo humano reunido em torno de um aparelho de TV, absorvidos pela contemplação de uma imagem de realidade que possa transcender, de forma virtualizada, a dura e triste realidade factual que se impõe ao redor.

É a este escapismo, à guisa de transcendência, que costumamos chamar “horário nobre”.

Imaginemos agora o gigantesco alcance de um projeto de esclarecimento público bem realizado... que pudesse entrar em todas as casas.

Sabemos que o meio de informação de mais alto alcance, na atualidade, é a televisão. Inútil é, portanto, apenas criticá-la e não enxergar suas potencialidades verdadeiramente libertadoras... A crítica se faz necessária e inevitável, sem dúvida, mas se refere apenas à situação presente, lamentável de fato, mas passível de mudança.

Para concretizarmos tal projeto, urge que combatamos o argumento banalizante, intelectualoide, de que a televisão é em si algo pérfido, maligno ou até demoníaco. Nada é mau em si, a menos que o ser humano assim o torne. Evidentemente, se dissermos em alto e bom tom, sem mais palavras, que “a televisão é o mais eficiente meio de educação”, passaríamos por loucos. E, no entanto, trata-se da mais pura verdade, com mais palavras...

Devemos separar, mais uma vez, as ideias de “ser” e “dever ser”. É agora que se faz ainda mais absurda a ideia de haver “falta de recursos” para isso. O que há, por sinal, é pura falta de vontade. Lembremos dos milhões gastos (e arrecadados) com o entretenimento e reflitamos nas possibilidades.

Ora, é inegável a necessidade de lazer e entretenimento; por que não uni-la às necessidades de esclarecimento?

Não só inútil como também contraproducente é concentrarmos nossa crítica no aspecto visível das atrações televisivas, pois o problema maior não é o que se mostra, mas a ausência do que deveria ser mostrado. Se o povo em geral faz questão de dar tanta audiência a certos programas, é certamente porque quer mesmo ver aquilo. Trata-se de um fato antropológico, e não pode ser encarado com moralismos.

Não se critica, aqui, o que a televisão mostra atualmente, pois seria uma perda de tempo, mero “chover no molhado” ou puro puritanismo (sincero moralismo ou hipocrisia pura e simples), crítica não-construtiva, enfadonha repetição de um conformismo imaginativo coletivo: coletiva preguiça de pensar.

O povo quer sexo: pois que se lhe dê sexo! – mas com a devida instrução. Isso em nada diminuiria o Ibope, caso fosse apresentado aos moldes de entretenimento, e não didaticamente, como numa sala de aula. Poderia haver um quadro fixo em um programa de alta audiência (como os que empesteiam as tardes de domingo), uma espécie de descontraído bate-papo com alguém que entenda do assunto, cientificamente, e ao mesmo tempo não tenha papas na língua e saiba comunicar-se em público, uma figura pública de identificação imediata. Havendo uma sessão de cartas dos espectadores, melhor ainda. O quadro se chamaria “Falando de Sexo” ou algo do tipo, e teria muitos minutos de duração, pois o assunto é inesgotável e absorvente. Não se excluiria eventuais atrativos do erotismo, justamente com o propósito de garantir a audiência, de modo definitivo. Certamente, seria um quadro aguardadíssimo pelos telespectadores, e renderia considerável audiência.

Não se pode tirar o sexo da TV (seria muito moralismo), mas acrescentar um elemento construtivo, instrutivo, ao lado do inevitável entretenimento de cunho erótico.

Bom é nos concentrarmos nas críticas construtivas. E há fortes motivos para colocarmos nosso foco primeiramente na questão de sexualidade.

Atentemos para o relato de um fato muito comum, que aparenta a princípio não guardar relação alguma com a mídia de massa, mas que se revela inadmissível em tempos de tanta celeuma em torno dos avanços da comunicação.

É notória a quantidade dos casos de preservativos que se rompem durante o ato sexual. E nem é preciso recorrermos a um instituto de pesquisa para nos dar conta disso: basta iniciarmos o assunto em qualquer roda de bate-papo, e logo ouviremos alguém (mais de uma pessoa, geralmente) comentar, com descontração, o seu caso de “arrebentamento” que se deve (“invariavelmente”) à má-qualidade do artefato. Há mesmo quem pense em reclamar para o INMETRO... É um fenômeno ocorre até entre universitários e as pessoas em geral que se alegam bem-informadas. O que está acontecendo?

Muito simples: a grandessíssima parte dos bilhões de seres humanos viventes neste planeta ainda não tomou conhecimento de que precisa tirar todo o ar do reservatório espermático localizado na extremidade do preservativo, antes de qualquer relação. Alguns fazem até o contrário: ignorando os mais elementares fatos da física, chegam a pensar que o ar deve ser deixado ali naquele minúsculo espaço, justamente para receber o sêmen...

E lembremos que, ocasionalmente, surgem na televisão nossos ministros da Saúde (quem quer que sejam), em brevíssimas propagandas “informativas”, apenas para dizer o que todos já sabem, e nunca a URGÊNCIA (simplíssima!) que quase todos desconhecem.

A falibilidade das propagandas informativas atuais é, pois, evidente. De nada adianta contratar os serviços de agências de publicidade que recheiam os anúncios de mirabolantes efeitos especiais ou imagens de impacto, se as noções mais importantes acerca de sexualidade (e o que dizer de outros assuntos!) são evitadas recorrendo-se ao insustentabilíssimo argumento do “tabu” popular que não pode ser ferido.

Falar-se em tabu, em circunstâncias assim, é mais que uma hipocrisia; é um autêntico assassinato da inteligência humana. Num país em que a maioria das crianças nem sequer acredita em Papai Noel (e nem o pode); onde a televisão mostra continuamente cenas quase explícitas de sexo fora de um contexto de horário e circunstância ou, pior ainda, violência explícita (sem o “quase”), o mínimo que se poderia fazer seria falar abertamente de temas como sexo e violência, pois as famílias, tanto quanto os núcleos domésticos, já conhecem bem a face fenomênica destes termos.

Os meios de comunicação têm plena capacidade de instruir a população no que esta mais precisa saber: para isto não é necessário que se gaste um só centavo a mais do que já se tem desperdiçado com a desinformação. Poderíamos ter aulas de política e cidadania durante os programas mais populares, sem que estes assuntos se mostrassem modorrentos e tediosos. A mídia possui mil recursos para tornar uma informação interessante e atraente, mas, aqui, continua valendo o mesmo que já dissemos sobre o ensino escolar – jovens que crescem desestimulados a estudar, pela falta de emoção e senso de aventura com que são transmitidos os conhecimentos.

Não há assunto que não possa ser abordado, nada a se esconder. Nada que possa chocar pessoas já acostumadas a assistir, forçadamente, o espetáculo sangrento dos reality shows do cotidiano...

Relembrando o quadro da “favela transcendente” anteriormente citado, pode-se conceber agora o poder de uma campanha efetiva, conjunta entre o Estado e a mídia de massa, no que diz respeito ao controle de natalidade e erradicação de doenças sexualmente transmissíveis, entre outros tópicos que servirão como ponto de partida para um mais amplo processo de reeducação coletiva, culminando na inserção de todas as pessoas na plenitude da cidadania.

Esta campanha, que gostaríamos de não considerar uma mera utopia, poderá chamar-se “Projeto Horário Nobre”; sendo arquitetada após sérios estudos dos temas abordados.









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